Por que excluir os gays
nas escolas?
Vicente Martins
E-mail: vicente.martins@uol.com.br
URL: http://sites.uol.com.br/vicente.martins/
Estamos, do ponto de vista tecnológico, na era da Informática,
mas em se tratando de educação de valores, ainda estamos na Idade Média.
Reproduzindo a cosmovisão dos nossos ancestrais, continuamos a não
respeitar as diferenças de sexo, cor e até de ideologia. Proponho,
aqui, uma reflexão sobre o papel dos educadores na reversão do
preconceito sexual na escola.
Em se tratando de civilização brasileira, avançamos muito pouco com
relação às idéias sobre corpo, alma e sexualidade inculcadas no século
XVI. A situação é ainda mais acentuada quando fazemos referência às
questões de ordem sexual no âmbito da educação escolar.
Este tema é, em geral, visto com olhar enviesado, estreito, apesar da
sociedade democrática ter escolhido, a partir do século XVIII, as
instituições de ensino, em todos os níveis, para acolher as grandes
questões que inquietam o meio social.
A homossexualidade é tema que educadores, sejam diretores,
coordenadores ou professores, com ou sem pós-graduação, fazem questão
de silenciar. Nós evitamos comentar o assunto. Ignoramos as crianças e
adolescentes com tendências homossexuais e ficamos torcendo, de forma
iníqua, que no futuro, isto é, na fase adulta, os homossexuais mudem
de opção sexual.
Na mídia, quando o tema é levantado, a intenção é gerar polêmica.
Em um programa televisivo, em rede nacional, o carismático Marcelo
Rossi (o padre pop) ao ser indagado sobre o que pensava sobre
homossexualidade, simplificou em dizer se tratar de doença, o que
acabou por provocar ação judicial impetrada por entidades gays do País.
Não há de ser oportuno, no âmbito da educação escolar, uma reflexão
sobre o assunto? Por que a escola não é lugar para respeitar as
diferenças sexistas? Poderíamos continuar indiferente à problemática
da sexualidade. Diriam, assim, alguns educadores: `` Se não sou
homossexual, o que tenho a ver com os que o são?. Exatamente, por
termos nossa opção sexual resolvida, devemos ter uma preocupação com
aqueles que, sendo crianças ou adolescentes, estão se definindo
sexualmente para a vida.
Ao fazer referência às escolas públicas, essa questão da
homossexualidade sofre com um preconceito muito acentuado. Ao fazer
referência às escolas privadas, pouco se discute, pouco se fala, pouco
se reflete, gerando, não poucas vezes, comportamentos sutilmente
agressivos de professores com relação aos alunos homossexuais, sejam
meninos ou meninas. Nas escolas privadas, aceita-se o matriculado, mas não
se tolera o educando com tendência homossexual. A diferença entre
escola pública e privada, nesse particular, é que, naquela, não há o
princípio de tolerância. Para algumas escolas conservadoras, não há
diferença entre o aidético e o homossexual: todos sofrem com o
preconceito social.
Começo por lançar algumas propostas de reversão desse preconceito:
primeiramente, aponto quem considero responsável pelo preconceito
contra os homossexuais no século XX: o Estado. Explico: o Estado tem
contribuído nos avanços culturais com relação à questão da
sexualidade e às reivindicações das massas, mas esses avanços foram
mais em termos de discurso jurídico e esvaziado de práxis. O Estado
promoveu iniciativas judiciais em favor das minorias de cor, de sexo ou
de raça, todavia chegamos ao final do século XX, com muita cerimônia
na discussão sobre sexualidade, sobretudo sobre sua faceta homossexual.
Neste século XXI, creio que o Estado, através de uma Constituinte
Planetária, deverá revelar e consolidar os valores éticos e morais da
nova sociedade informática, a começar pela própria América Latina.
Revisando, assim, através de uma democracia direta (via Internet), a
longa tradição secular e jurídica de dissimular a diversidade de
comportamento sexual, de modo a fazer, abertamente, a judicialização
da sexualidade humana. Espero que nos próximos dez anos, o Estado
nacional venha a determinar, juridicamente, que a homossexualidade não
é uma inversão ou doença, como julgam alguns párocos e educadores
mais duros, mas uma opção sexual. Em substância, no século XXI em
construção, a homossexualidade não será tabu.
Sem fundamento jurídico que condene o comportamento sexual, não haverá
proibição ou perseguição à homossexualidade. Nisso, talvez desapareça
a noção de gênero, isto é, de diferença biológica de masculino e
feminino, em que todos nós, homens ou mulheres, seremos apenas andróginos.
Estaremos, enfim, numa época em que corpo, alma, ecologia e sexualidade
constituirão novo ramo bioético. Isso não é futurologia, mas revolução
ecossexual, em que o respeito às diferenças de gênero e opção
sexual será a base para o desenvolvimento humano e da sustentabilidade.
Reconheço que o tema merecerá maior reflexão, razão pela qual ei-lo
como proposta de fórum permanente, tema recorrente, para apreciação e
julgamento dos inquisidores da moral e dos bons costumes.
Vicente
Martins é professor do Centro de Letras e Artes da Universidade
Estadual Vale do Acaraú (UVA)
Fonte: MARTINS, Vicente. (2001). “ Por que
excluir os gays nas escolas”. Disponível na Internet: http://www.opovo.com.br/200106/17/opiniao/17OP0702.asp.
Capturado em 17 de junho de 2001.
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